Uma pergunta que eu recebo com frequência é sobre a diferença entre o hebraico bíblico e o hebraico moderno.
Em primeiro lugar, devemos saber que é o mesmo idioma. Seja o bíblico ou o moderno, o idioma é o hebraico, não são línguas diferentes ou separadas. Mas então qual a diferença?
Para simplificar, vamos falar de dois pontos básicos que diferenciam: a época e a aplicação.
A época
O hebraico Bíblico era o hebraico usado no mundo antigo, há 3 mil anos atrás. Era o hebraico usado em Israel nos tempos bíblicos.
O hebraico moderno é o hebraico usado em Israel nos dias de hoje.
O mundo muda, a língua muda. Todos os idiomas mudam ao longo do tempo. Será que a língua portuguesa de hoje é igual à de mil anos atrás? Com certeza tem diferenças, apesar de ainda ser o mesmo idioma.
Quais são as mudanças que acontecem numa língua?
A primeira coisa é o surgimento de novas palavras. Qualquer idioma moderno tem muito mais palavras do que tinha no passado.
Hoje em dia precisamos falar sobre computadores, telefones, aviões, carros, energia elétrica, e mais um milhão de coisas que não existiam no passado.
O hebraico moderno fala de coisas que nos tempos bíblicos não existiam. Precisa expressar ideias mais complexas.
A segunda mudança que acontece nos idiomas é a simplificação de algumas estruturas, ou seja, algumas formas mais “complicadas” de falar são substituídas por outras mais simples; ou a forma de escrever que é simplificada (ortografia).
No português houve bastante alteração na escrita, como o exemplo clássico de “pharmacia”, que antes era escrito com “ph”.
Já o hebraico não sofreu alterações significativas na ortografia (houve mudança na forma de escrever as letras, como vimos no artigo sobre o alfabeto, mas não na escrita das palavras).
Mas surgiram algumas formas mais “práticas” de falar certas coisas, para substituir umas falas mais “rebuscadas”. Por exemplo, a declinação das palavras para formar o possessivo é substituída pelo uso de uma preposição, evitando “alterar” as palavras o tempo inteiro dependendo de sua função na frase. Algumas formas de conjugações verbais mais complexas também não são comumente usadas.
Exemplo:
הסוסים
“Hassussim”
quer dizer “os cavalos“.
No hebraico moderno, se eu quero dizer
“os cavalos de David“, eu digo:
הסוסים של דויד
“Hassussim shel David“,
sendo “shel” o equivalente a “de” em português.
Já no hebraico clássico, para dizer
“os cavalos de David” seria assim:
סוסי דויד
“Sussei David“.
Ficou mais curto, mas eu precisei alterar a palavra, transformei “Hassussim” em “Sussei“.
O surgimento do Hebraico moderno
O fato diferente que ocorreu com o Hebraico em relação ao português ou outras línguas, é que ele não veio passando por este processo de transformação natural pelos falantes ao longos dos últimos séculos.
O hebraico passou muitos anos sem ser falado como língua viva, tinha se tornado já uma língua “morta”. Era apenas a língua da Bíblia, da literatura e da liturgia.
Lá para o século 19 e 20 é que ele ressuscitou, sendo reconstruído a partir do Hebraico Bíblico, principalmente pelo trabalho do linguista chamado Eliezer ben Yehudá. Então foram criadas as novas palavras do mundo moderno, e o hebraico passou a ser a língua oficial de Israel.
A aplicação
Nós já falamos que a primeira diferença entre o hebraico bíblico e o hebraico moderno é a época. É o mesmo idioma em épocas diferentes, portanto com algumas diferenças.
A segunda coisa que vamos falar é sobre a aplicação. Por que alguém aprende hebraico moderno ou hebraico bíblico? Para que são usados? Qual o tipo de linguagem?
O hebraico moderno é o hebraico usado hoje em dia para qualquer finalidade, seja numa conversa coloquial em qualquer ambiente, seja na televisão, na internet, ou num discurso formal; seja na escrita de um jornal, de um artigo científico, de uma revista de fofoca, de um livro sobre qualquer tema, incluindo obras literárias modernas.
Quem estuda o hebraico moderno tem como objetivo se comunicar no idioma de todas as formas, ou seja, conversar, falar, escutar, escrever e ler textos modernos.
Já o Hebraico Bíblico, na verdade, não é simplesmente o hebraico que era falado há 3 mil anos atrás, mas é uma linguagem literária.
O Hebraico Bíblico é a linguagem de 3 mil anos atrás que era usado na literatura sagrada.
Não era a linguagem coloquial, usada no cotidiano das pessoas. Era a linguagem erudita da época. O texto Bíblico, apesar de simples, é um texto de caráter literário, que possui arte e erudição, seja em poesia ou prosa.
Não, as pessoas não falavam difícil naquela época. Elas tinham sua linguagem coloquial, seus regionalismos, gírias, e diferentes formas de falar em diferentes grupos sociais e diferentes ambientes.
Mas para escrever textos sagrados, usava-se uma linguagem literária.
Portanto, estudar o Hebraico Bíblico, não é estudar simplesmente o Hebraico antigo, mas é estudar o Hebraico usado em uma literatura específica, que é o texto Bíblico.
Estudar o Hebraico Bíblico é estudar uma linguagem totalmente aplicada e específica do idioma. O objetivo de estudar o Hebraico Bíblico é ler a Bíblia em Hebraico.
Resumindo…
Para termos práticos: Se o seu objetivo é conversar em Hebraico, morar em Israel, ler textos atuais, você precisa estudar o Hebraico moderno. Você precisa aprender o vocabulário moderno, a linguagem do dia-a-dia, e focar principalmente na conversação.
Mas se o seu objetivo é ler a Bíblia no original em hebraico, você precisa aprender uma linguagem mais específica, que é a linguagem literária da Bíblia, e o seu foco não será a conversação, mas a leitura de textos.
Mas a boa notícia é que para começar os estudos o caminho é um só, tanto para o Hebraico Bíblico como para o Moderno: você primeiro precisa aprender a ler, e a escrita é mesma.
Aprendendo a ler em Hebraico, você vai poder estudar tanto o Bíblico como o moderno, ou os dois, com a diferença que no Hebraico moderno logo você vai ter que ler sem vogais, enquanto no Bíblico não necessariamente vai precisar se preocupar com isto. Mas acredite, ler sem vogais é mais fácil do que você imagina, a medida que você conhece o idioma, naturalmente você aprende.
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